O funcionamento do FUNDEB


Escola Estadual D. Pedro II, Belo Horizonte

Escrevo esse artigo para suprir uma lacuna pessoal: compreender como se processa o funcionamento geral do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação, mais conhecido pela sigla de FUNDEB, instrumento poderoso nos custeios estaduais e municipais da educação pública em todo o território nacional. Ao tracejar o funcionamento do FUNDEB, poderemos fortalecer a nossa percepção do quão importante é a defesa de um dos fundos governamentais mais exitosos da República Brasileira desde a Redemocratização em 1985. O Fundo encontra-se no último ano de vigência legal de acordo com a lei que estabeleceu o funcionamento temporário do custeio da educação por 14 anos. Os documentos legais são a Emenda Constitucional nº 53 de 2006 e o art. 60, caput, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT). Na prática, o FUNDEB expirará em dezembro de 2020, de modo que caberá ao Congresso Nacional a mobilização para a sua renovação, tendo a pressão da sociedade organizada como esteio. Atualmente, existem três projetos de Emenda à Constituição que circulam no Congresso para transformar o FUNDEB em um fundo permanente. Tratam-se de iniciativas da deputada Raquel Muniz (PSC/MG) e dos senadores Jorge Kajuru (PSB/GO) e Randolfe Rodrigues (REDE/AP).

Os artigos 205 e 206 da Constituição Federal Brasileira apregoam as bases sobre as quais se observa que a educação é um “direito de todos e dever do Estado de da família” (art. 205), tendo por objetivo tanto a formação cidadã quanto à preparação para o mercado de trabalho. A Constituição fundamenta em seu inciso I, do art. 206, que o ensino será ministrado com base no princípio de “igualdade de condições para o acesso e permanência na escola.” Deste modo, o FUNDEB inscreve-se na ambiciosa perspectiva de diminuir dramaticamente as desigualdades regionais no acesso à educação das mais diversas redes de ensino espalhadas pelo vasto Brasil.

Essa orientação voltada para a diminuição das desigualdades regionais no acesso à educação faz de parte de uma política de ESTADO, não podendo ser considerada como obra partidária voltada à exaltação de partidos políticos ou figuras públicas. Qualquer governo que se constitua a frente da União tem o dever de perseguir esse objetivo principal. O FUNDEB, como grande instrumento de democratização na repartição de recursos da educação, não se limita a uma política de esquerda ou direita. Trata-se de um patrimônio institucional iniciado pelo FUNDEF, legado ao povo brasileiro por sucessivos governos desde a década de 1990.

No âmbito dos 26 Estados da Federação, além do Distrito Federal, o FUNDEB é composto por 20% das receitas de impostos federais e estaduais. No âmbito de cada Estado, o FUNDEB se compõe de 20% das receitas dos seguintes impostos:

·         Fundo de Participação dos Estados – FPE
·         Fundo de Participação dos Municípios – FPM
·         Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços – ICMS
·         Imposto sobre Produtos Industrializados, proporcional às exportações – IPIexp
·         Desoneração das Exportações (LC nº 87/96)
·         Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doações – ITCMD
·         Imposto sobre Propriedade de Veículos Automotores – IPVA
·         Cota Parte de 50% do Imposto Territorial Rural – ITR, devida aos municípios
  
No site do Tesouro Nacional é possível pesquisar o montante repassado pelo FUNDEB à federação, estados e municípios. No ano de 2019, por exemplo, o Estado de Minas Gerais recebeu do fundo a quantia de R$ 8.000.129.278,04 (Oito bilhões, cento e vinte e nove mil, duzentos e setenta e oito reais e quatro centavos). O município de Muriaé recebeu inversões do FUNDEB, também no ano de 2019, de R$ 39.819.542,28 (Trinta e nove milhões, oitocentos e dezenove mil, quinhentos e quarenta e dois reais e vinte e oito centavos) [1].

O critério básico para a distribuição dos recursos do FUNDEB leva em consideração o número de alunos matriculados na educação pública presencial, de acordo com os dados emitidos pelo Censo Escolar do ano anterior. Por exemplo, a quantidade de recursos disponibilizada por aluno em 2020 toma como parâmetro o Censo Escolar de 2019. Instituições comunitárias, confessionais e filantrópicas que tenham convênio com o Poder Público também entram no bolo de repartição do FUNDEB caso matriculem:

a) crianças de até 3 anos na educação infantil oferecida em creches;
b) crianças na idade pré-escolar entre 4 e 5 anos;
c) crianças matriculadas em educação do campo por instituições conveniadas e também na educação especial, desde que observem os regulamentos legais.

De acordo com o art. 10 da Lei 11.494/2007, a distribuição de recursos do FUNDEB precisa levar em consideração os chamados “fatores de ponderação” nos quais se estabelecem as diferenças nas condições reais para o oferecimento do serviço na educação pública. O legislador entendeu que diferentes cenários sociais em que a educação é prestada devem influenciar na quantidade de recursos empregada pelo poder público. O fator de ponderação base estabelece como referência o aluno matriculado na educação presencial urbana. A partir disso, temos as seguintes variedades na distribuição de recursos:

Nível de ensino
Fator de ponderação
Creche em tempo integral pública
1,30
Creche em tempo integral conveniada
1,10
Pré-escola em tempo integral 
1,30
Creche em tempo parcial pública
1,15
Creche em tempo parcial conveniada
0,80
Pré-escola em tempo parcial
1,05
Anos iniciais do Ensino Fundamental urbano
1,00
Anos iniciais do Ensino Fundamental no campo
1,15
Anos finais do Ensino Fundamental urbano
1,10
Anos finais do Ensino Fundamental no campo
1,20
Ensino Fundamental em tempo integral
1,30
Ensino Médio urbano
1,25
Ensino Médio no campo
1,30
Ensino Médio em tempo integral
1,30
Curso Técnico Integrado (Ensino Médio Integrado com
Educação Profissional)
1,30
Educação especial
1,20
Educação indígena e quilombola
1,20
Educação de Jovens e Adultos com avaliação no processo
0,80
Educação de Jovens e Adultos integrada à Educação Profissional de nível Médio, com avaliação no processo
1,20
Fonte: Site Todos pela Educação

De acordo com os fatores de ponderação mencionados acima, valor por aluno pode variar para mais ou para menos em função das condições em que ele se encontre. Por exemplo, alunos da educação especial recebem 20% a mais do que a média. Já alunos matriculados no EJA (Ensino de Jovens e Adultos) recebem 80% do que receberiam os discentes inscritos no ensino fundamental urbano.

A União tem o dever de complementar os recursos do FUNDEB sempre que o valor médio por aluno definido em cada Estado não alcançar o patamar definido nacionalmente. Trata-se de um princípio capaz de garantir alta equidade na distribuição de recursos da educação pública básica, pois nivela com os mesmos aportes os discentes das mais variadas regiões brasileiras, de norte a sul. Em 2019, o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) nos informa acerca da existência de 39.399.319 alunos matriculados na educação básica, resultando num custeio de aproximadamente R$ 4.278 por aluno ao ano. Esse valor, obviamente, refere-se à média geral. 

O artigo 22, caput, da Lei nº 11.494/2007 obriga que 60% dos recursos anuais do FUNDEB sejam repassados para o pagamento do salário dos professores da ativa na rede de educação pública. Além dos professores, outros profissionais correlatos na área de educação também podem se beneficiar do fundo para custeio do próprio salário, como o pessoal do suporte pedagógico, inspeção, supervisão, orientação educacional e coordenação pedagógica. Os outros 40% do fundo devem ser utilizados na capacitação do pessoal docente; aquisição, manutenção, construção e conservação das instalações de ensino, concessão de bolsas de estudo a alunos de escolas públicas e privadas, aquisição de material didático e financiamento do transporte escolar.

Esperamos que no ano de 2020, mesmo diante de todas as dificuldades sanitárias, políticas e institucionais apresentadas, nasça um Novo FUNDEB capaz de garantir o financiamento da educação pública no Brasil. Não é de outra sorte que a Constituição Federal promulgada em 5 de outubro de 1988 trazia em seu espírito o direito universal ao ensino, sendo o FUNDEB o mais exitoso instrumento republicano para a realização de tão nobre pretensão. Não podemos jogar às moscas um patrimônio institucional que tem demonstrado tanto sucesso na distribuição dos recursos da educação. É hora de conservá-lo e aprimorá-lo para que o ensino público possa ser oferecido às gerações do futuro.

Documentos
Constituição Federal/1988
https://www2.camara.leg.br/atividade-legislativa/legislacao/Constituicoes_Brasileiras/constituicao1988.html/arquivos/ConstituicaoTextoAtualizado_EC%20105.pdf
Lei nº 11.494/2007, regulamenta o FUNDEB
https://www2.camara.leg.br/legin/fed/lei/2007/lei-11494-20-junho-2007-555612-normaatualizada-pl.pdf

Relatório Tribunal de Contas/Rio e Instituto Rui Barbosa
http://www.atricon.org.br/wp-content/uploads/2020/02/Fundeb_IRB.pdf

Fontes eletrônicas
[1] O site do Tesouro Nacional também apresenta com detalhes as repartições por imposto para cada município. Ver http://sisweb.tesouro.gov.br/apex/f?p=2600:1::MOSTRA:NO:RP:: 
Portal do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação
https://www.fnde.gov.br/index.php/financiamento/fundeb/sobre-o-plano-ou-programa/funcionamento
Site ONG Todos pela Educação
https://www.todospelaeducacao.org.br/conteudo/perguntas-e-respostas-o-que-e-e-como-funciona-o-fundeb

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